Diversão com Fé
Os embalos de sábado à noite podem ser diferentes. Embora os verbos “ficar” e “beber” sejam proibidos no dicionário evangélico, os jovens crentes mostram que é possível se divertir sem abrir mão de palavrinhas mágicas como “obediência” e “limites”. É claro que nem todos seguem os conselhos dos pastores e alguns são até apelidados de “terra” ou de “raimundos” – crentes com um pé na Igreja e outro no mundo. Mas como a maioria se sente vigiada 24 horas, tanto pelos irmãos quanto por Deus, prefere não ultrapassar a linha invisível que separa a vida espiritual e a mundana.
A preparação dos jovens crentes para as festas do final de semana se parece com a de qualquer outro jovem. Eles juntam dinheiro, vestem roupas da moda e marcam encontros. Uns até formam grupos do Bolinha e da Luluzinha, como é freqüente na juventude. Mas basta passar da porta de casa para tudo mudar. As opções de lazer não devem incluir os verbos “ficar”, “fumar” e “beber”. Drogas, então, nem pensar.
Para dançar, só se for ao som de músicas gospel. As boates e bares, neste contexto, são trocados por shows realizados na Mansão do Louvor, no Português e no Chevrolet Hall. Há festas que começam às 20h do sábado e terminam na madrugada do domingo, com ritmos para todos os gostos e que falam de Jesus. Todos os encontros são acompanhados de orações, abraços e lágrimas. Lágrimas de arrependimento ou de alegria. O show do Ministério de Louvor Diante do Trono, realizado no Chevrolet Hall, no início do mês, foi um exemplo típico de como se dá uma “noitada” cristã.
Os jovens dançaram, sentaram no chão, cochilaram nos ombros dos amigos, colocaram o assunto em dia e fizeram amizades. Mas também pensaram no que fizeram ao longo da semana, refletiram sobre o comportamento dentro de casa, na escola, no trabalho e na Igreja. “Deus não habita em locais que não edificam seu nome, lugares de alegria passageira. A diferença entre um show de Diante do Trono, por exemplo, e outro do ‘mundo’ é que, depois daqui, eu não corro o risco de me acidentar, não fico de ressaca moral, nem física. Ainda mais, encontro amizades verdadeiras”, conta Ana Katarina Barbosa Calado, 18 anos, moradora de Caruaru.
Para os jovens que se conhecem entre uma música e outra dos shows, não é preciso se desesperar quando não há festas. Eles contam que, aos sábados, é possível visitar outras igrejas, programar sessões de cinema na casa dos amigos, ir a uma lanchonete ou juntar um grupo para tocar violão. Segundo eles, passar dos limites está fora da moda ditada por Jesus Cristo há mais de 2 mil anos. “Eu me converti há uns 10 anos. Quando eu me alimento espiritualmente, a vida tem mais sentido”, afirma Davyd Marcondy, 21 anos, da Igreja Vale da Benção.
À espera da promessa
Os "amassos" sem compromisso e o sexo antes do casamento devem passar longe dos momentos de diversão dos jovens evangélicos. Para a maioria deles, ser objeto de desejo por uma noite ou perder a virgindade antes do tempo traz sofrimentos emocionais e espirituais. É claro que a juventude crente pode namorar. Na maioria das vezes, no entanto, os jovens desta crença demoram mais tempo para escolher um parceiro. Ao todo, 88, 9% dos protestantes apóiam a castidade, segundo a pesquisa inédita Juventude, Religião e Política na Baixada Fluminense. Apenas 26,1% dos católicos pensam da mesma forma, para se ter uma idéia de como a prática parece conservadora para outras crenças.
Amor à primeira vista pode até acontecer entre duas pessoas num evento de massa, mas antes que o namoro se concretize, eles são orientados pelos pais e pela Igreja a orar bastante e jejuar até ouvir a "confirmação" de Deus. “Ninguém quer ser usado como um copo descartável. Todo mundo quer ser especial. Também deve ser assim na área sexual. Se o outro não quer esperar até o casamento, é porque não quer ter um compromisso nem com você, nem com Deus. Eu e meu namorado decidimos manter a castidade. Para ter um relacionamento abençoado, é preciso fazer a vontade de Deus”, afirma Ana Paula Pinheiro Neves, da Igreja Apostólica Batista Viva.
No tocante a relacionamentos, os jovens ainda são aconselhados a não namorar com pessoas de outras religiões. Se isso acontecer e o jovem tiver um cargo na Igreja, ele pode até ser afastado. Já no caso de os dois pertecerem a Igrejas diferentes, o namoro deve preceder de uma decisão. Normalmente, o que pertence à denominação mais rígida permanece onde está, enquanto o outro precisa fazer a travessia. Quando as duas doutrinas são parecidas, a mulher tende a ceder. Não há machismo nisso, para eles, porque o homem é considerado o cabeça da casa e, portanto, do relacionamento.
Entre o céu e a terra
Apesar da “batalha espiritual” para ser diferente, alguns jovens evangélicos se divertem em eventos que têm semelhanças com os do mundo. A Expo Gospel, que acontece anualmente em Olinda, pode deixar alguns desavisados de cabelo em pé. No ano passado, enquanto pastores pregavam no hall principal do Centro de Convenções, alguns jovens dançavam funk gospel em outro local, ao som de um DJ e com direito a descer até embaixo. No vocabulário dos irmãos jovens mais rígidos, isso se chama escandalizar, ou melhor, envergonhar o Evangelho e colocar a salvação em risco.
O funk, aliás, é o tipo de música que mais desperta polêmica entre a juventude cristã, diferentemente de outros ritmos, como forró e rock. Mas ele está cada vez mais popularizado no meio. Na Marcha para Jesus, realizada em Boa Viagem em junho, também houve espaço para o funk. “Aqueles que são falsos crentes saem com a intenção de paquerar e muitos ‘ficam’. Na Expo Gospel de 2007, para onde eu ia, eles queriam pegar em mim, me puxavam. Eu era nova convertida e não sabia muito bem como me comportar. Depois, eu fui para uma discoteca no Recife Antigo e lá também tocava funk. Foi uma decepção total, porque nós temos que ser diferentes, ser luz. Agora, eu já sei os lugares onde ir”, afirmou Juliana Estéfani, 21 anos, da Igreja Presbiteriana.
Curiosidades do mundo jovem evangélico
Desafiando Gigantes é o filme favorito dos jovens evangélicos desde o ano passado. A obra foi escrita, dirigida e estrelada por amadores, com um orçamento pífio para os padrões hollywoodianos. O filme de US$ 100 mil chegou a ser proibido para menores de 18 anos nos EUA, por ser considerado “evangelista demais”, mas faturou mais de US$ 10 milhões. A película foi rodada pela Sherwood Baptist Church, em Albany (EUA).
Lázaro, ex-vocalista da banda Olodum, atualmente é o cantor preferido dos jovens e crianças em Pernambuco. Ele é convertido há nove anos e tem um testemunho arrasador. Lázaro ficou na miséria, passou fome, afastou-se dos pais e perdeu toda fortuna por conta das drogas. Hoje, ele recuperou a família e diz estar liberto da cocaína, do cigarro e do álcool. Lázaro é visto como um artista simples, sendo um dos poucos no meio que não anda com seguranças. Ninguém ouse fazer aquele tipo de coro “Lázaro, cadê você, viemos aqui só pra te ver” que ele não gosta.
Diante do Trono, André Valadão, Os Filhos do Homem, Kléber Lucas, David Quinlan são sucesso entre os jovens crentes. Diante do Trono levou cerca de 30 mil pessoas ao Chevrolet Hall nos dois dias de show feitos no Recife. Os eventos de maior público são a Expo gospel – onde se expõe produtos evangélicos, realizam-se apresentações com DJs, cantores e pregações; A Marcha para Jesus, o Recifeliz com Jesus e o Sem João, com Jesus.
Uma pesquisa inédita expôs um retrato da religiosidade no país. Dos 47.832.671 jovens brasileiros, 18,8% (ou 8,97 milhões) são evangélicos. Deste número, 88,9% deles reprovam o sexo antes do casamento e 67% discordaram do aborto. Fora de casa, o lazer preferido deles (18,5%) é ir à Igreja. Os outros interesses estão pulverizados. Dentro de casa, os jovens crentes gostam de assistir TV (29,9%) e ler livros (13,3%).
Os evangélicos se sentem as maiores vítimas da discriminação. De 152,9 mil jovens que admitiram sofrer preconceito, 33,4 mil passaram por maus bocados dentro de casa; 90,7 mil foram alvo de discriminação na escola ou na faculdade; 28,6 mil sofreram discriminação em locais públicos. Isso se deve, de acordo com o estudo, ao fato de o protestante ter de exercer a fé de forma ativa e pregar o evangelho.
Fonte: Jovens entrevistados pelo Diario e dados da Pesquisa Juventude: o que une e o que separa. Unesco, 2004; Juventude, Religião e Política na Baixada Fluminense.
A preparação dos jovens crentes para as festas do final de semana se parece com a de qualquer outro jovem. Eles juntam dinheiro, vestem roupas da moda e marcam encontros. Uns até formam grupos do Bolinha e da Luluzinha, como é freqüente na juventude. Mas basta passar da porta de casa para tudo mudar. As opções de lazer não devem incluir os verbos “ficar”, “fumar” e “beber”. Drogas, então, nem pensar.
Para dançar, só se for ao som de músicas gospel. As boates e bares, neste contexto, são trocados por shows realizados na Mansão do Louvor, no Português e no Chevrolet Hall. Há festas que começam às 20h do sábado e terminam na madrugada do domingo, com ritmos para todos os gostos e que falam de Jesus. Todos os encontros são acompanhados de orações, abraços e lágrimas. Lágrimas de arrependimento ou de alegria. O show do Ministério de Louvor Diante do Trono, realizado no Chevrolet Hall, no início do mês, foi um exemplo típico de como se dá uma “noitada” cristã.
Os jovens dançaram, sentaram no chão, cochilaram nos ombros dos amigos, colocaram o assunto em dia e fizeram amizades. Mas também pensaram no que fizeram ao longo da semana, refletiram sobre o comportamento dentro de casa, na escola, no trabalho e na Igreja. “Deus não habita em locais que não edificam seu nome, lugares de alegria passageira. A diferença entre um show de Diante do Trono, por exemplo, e outro do ‘mundo’ é que, depois daqui, eu não corro o risco de me acidentar, não fico de ressaca moral, nem física. Ainda mais, encontro amizades verdadeiras”, conta Ana Katarina Barbosa Calado, 18 anos, moradora de Caruaru.
Para os jovens que se conhecem entre uma música e outra dos shows, não é preciso se desesperar quando não há festas. Eles contam que, aos sábados, é possível visitar outras igrejas, programar sessões de cinema na casa dos amigos, ir a uma lanchonete ou juntar um grupo para tocar violão. Segundo eles, passar dos limites está fora da moda ditada por Jesus Cristo há mais de 2 mil anos. “Eu me converti há uns 10 anos. Quando eu me alimento espiritualmente, a vida tem mais sentido”, afirma Davyd Marcondy, 21 anos, da Igreja Vale da Benção.
À espera da promessa
Os "amassos" sem compromisso e o sexo antes do casamento devem passar longe dos momentos de diversão dos jovens evangélicos. Para a maioria deles, ser objeto de desejo por uma noite ou perder a virgindade antes do tempo traz sofrimentos emocionais e espirituais. É claro que a juventude crente pode namorar. Na maioria das vezes, no entanto, os jovens desta crença demoram mais tempo para escolher um parceiro. Ao todo, 88, 9% dos protestantes apóiam a castidade, segundo a pesquisa inédita Juventude, Religião e Política na Baixada Fluminense. Apenas 26,1% dos católicos pensam da mesma forma, para se ter uma idéia de como a prática parece conservadora para outras crenças.
Amor à primeira vista pode até acontecer entre duas pessoas num evento de massa, mas antes que o namoro se concretize, eles são orientados pelos pais e pela Igreja a orar bastante e jejuar até ouvir a "confirmação" de Deus. “Ninguém quer ser usado como um copo descartável. Todo mundo quer ser especial. Também deve ser assim na área sexual. Se o outro não quer esperar até o casamento, é porque não quer ter um compromisso nem com você, nem com Deus. Eu e meu namorado decidimos manter a castidade. Para ter um relacionamento abençoado, é preciso fazer a vontade de Deus”, afirma Ana Paula Pinheiro Neves, da Igreja Apostólica Batista Viva.
No tocante a relacionamentos, os jovens ainda são aconselhados a não namorar com pessoas de outras religiões. Se isso acontecer e o jovem tiver um cargo na Igreja, ele pode até ser afastado. Já no caso de os dois pertecerem a Igrejas diferentes, o namoro deve preceder de uma decisão. Normalmente, o que pertence à denominação mais rígida permanece onde está, enquanto o outro precisa fazer a travessia. Quando as duas doutrinas são parecidas, a mulher tende a ceder. Não há machismo nisso, para eles, porque o homem é considerado o cabeça da casa e, portanto, do relacionamento.
Entre o céu e a terra
Apesar da “batalha espiritual” para ser diferente, alguns jovens evangélicos se divertem em eventos que têm semelhanças com os do mundo. A Expo Gospel, que acontece anualmente em Olinda, pode deixar alguns desavisados de cabelo em pé. No ano passado, enquanto pastores pregavam no hall principal do Centro de Convenções, alguns jovens dançavam funk gospel em outro local, ao som de um DJ e com direito a descer até embaixo. No vocabulário dos irmãos jovens mais rígidos, isso se chama escandalizar, ou melhor, envergonhar o Evangelho e colocar a salvação em risco.
O funk, aliás, é o tipo de música que mais desperta polêmica entre a juventude cristã, diferentemente de outros ritmos, como forró e rock. Mas ele está cada vez mais popularizado no meio. Na Marcha para Jesus, realizada em Boa Viagem em junho, também houve espaço para o funk. “Aqueles que são falsos crentes saem com a intenção de paquerar e muitos ‘ficam’. Na Expo Gospel de 2007, para onde eu ia, eles queriam pegar em mim, me puxavam. Eu era nova convertida e não sabia muito bem como me comportar. Depois, eu fui para uma discoteca no Recife Antigo e lá também tocava funk. Foi uma decepção total, porque nós temos que ser diferentes, ser luz. Agora, eu já sei os lugares onde ir”, afirmou Juliana Estéfani, 21 anos, da Igreja Presbiteriana.
Curiosidades do mundo jovem evangélico
Desafiando Gigantes é o filme favorito dos jovens evangélicos desde o ano passado. A obra foi escrita, dirigida e estrelada por amadores, com um orçamento pífio para os padrões hollywoodianos. O filme de US$ 100 mil chegou a ser proibido para menores de 18 anos nos EUA, por ser considerado “evangelista demais”, mas faturou mais de US$ 10 milhões. A película foi rodada pela Sherwood Baptist Church, em Albany (EUA).
Lázaro, ex-vocalista da banda Olodum, atualmente é o cantor preferido dos jovens e crianças em Pernambuco. Ele é convertido há nove anos e tem um testemunho arrasador. Lázaro ficou na miséria, passou fome, afastou-se dos pais e perdeu toda fortuna por conta das drogas. Hoje, ele recuperou a família e diz estar liberto da cocaína, do cigarro e do álcool. Lázaro é visto como um artista simples, sendo um dos poucos no meio que não anda com seguranças. Ninguém ouse fazer aquele tipo de coro “Lázaro, cadê você, viemos aqui só pra te ver” que ele não gosta.
Diante do Trono, André Valadão, Os Filhos do Homem, Kléber Lucas, David Quinlan são sucesso entre os jovens crentes. Diante do Trono levou cerca de 30 mil pessoas ao Chevrolet Hall nos dois dias de show feitos no Recife. Os eventos de maior público são a Expo gospel – onde se expõe produtos evangélicos, realizam-se apresentações com DJs, cantores e pregações; A Marcha para Jesus, o Recifeliz com Jesus e o Sem João, com Jesus.
Uma pesquisa inédita expôs um retrato da religiosidade no país. Dos 47.832.671 jovens brasileiros, 18,8% (ou 8,97 milhões) são evangélicos. Deste número, 88,9% deles reprovam o sexo antes do casamento e 67% discordaram do aborto. Fora de casa, o lazer preferido deles (18,5%) é ir à Igreja. Os outros interesses estão pulverizados. Dentro de casa, os jovens crentes gostam de assistir TV (29,9%) e ler livros (13,3%).
Os evangélicos se sentem as maiores vítimas da discriminação. De 152,9 mil jovens que admitiram sofrer preconceito, 33,4 mil passaram por maus bocados dentro de casa; 90,7 mil foram alvo de discriminação na escola ou na faculdade; 28,6 mil sofreram discriminação em locais públicos. Isso se deve, de acordo com o estudo, ao fato de o protestante ter de exercer a fé de forma ativa e pregar o evangelho.
Fonte: Jovens entrevistados pelo Diario e dados da Pesquisa Juventude: o que une e o que separa. Unesco, 2004; Juventude, Religião e Política na Baixada Fluminense.
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