domingo, 5 de agosto de 2007

Entrevista com Teresa Maia


Teresa Maia - O perfil de uma fotojornalista


Se a imprensa é o olho da sociedade, as fotografias são suas lembranças. Desde a famosa e extinta “lambe-lambe”, o fotojornalismo se revela como algo que além de completar o texto jornalismo tem em si uma essência própria que informa e agrada qualquer leitor. Teresa Cristina Maia Dantas de Góes, a Teresa Maia, entende muito bem disso. Apaixonada pela fotografia, aos 44 anos, Teresa se orgulha de ter vencido as dificuldades e quebrado as barreiras: em 1996, aos 170 anos, o jornal Diário de Pernambuco tinha sua primeira fotógrafa. Depois disso as coisas se equilibraram e hoje existem cinco fotógrafas e cinco fotógrafos nesse jornal.

Mas, além disso, sua paixão ainda lhe rende o reconhecimento, o fruto de um trabalho bem feito. Teresa é uma colecionadora de prêmios. Entre os mais importantes é possível destacar o Premio CREA de fotografia (2006), a menção honrosa no premio Rey de España (2006), Cristina Tavares (1997), Vladimir Herzog e Ayrton Senna (2004).

Consciente de sua importância como fotógrafa para o jornal, Teresa é conhecidíssima por sua competência e dedicação que lhe renderam estes prêmios. Apesar das dificuldades editorias atuais, ela mostra-se otimista com o processo digital. Mesmo afirmando que “hoje todo mundo virou fotógrafo”, reconhece a facilidade que a digitalização proporcionou.

A visão de Teresa sobre a fotografia da infância – o que mais gosta de fazer –impressiona, pois assim como ela mesma fala, seu olho parece estar treinado para isso. Crianças carentes, outras nem tão carentes assim, chorando, sorrindo, jogando, brincando ou morrendo... Estas imagens com certeza marcam a carreira desta fotógrafa adepta da “rotina louca nossa de cada dia” e que diz preferir estar num presídio, ao fotografar objetos. A seguir, Teresa fala um pouco de sua profissão, vai dar suas opiniões sobre vários assuntos, vai contar histórias e vai revelar algo que é pouco explorado pelas pessoas: o perfil de uma fotógrafa.

ENTREVISTA

O que te levou a ser fotógrafa?
A fotografia pra mim começou como um hobby. Gostava muito de viajar e fotografava todas as minhas viagens. Basicamente foi este o começo. Sempre fotografei minha família: minha vó, minha mãe, irmãos, sobrinhos... Comecei a achar que levava jeito pra coisa e aí fiz alguns cursos.

Qual a importância do curso de jornalismo para os fotógrafos?
Não fiz jornalismo porque nunca me interessei pelo curso mesmo, apesar de trabalhar com comunicação, prefiro falar através de imagens. Minha relação com a fotografia sempre foi voltada para o fotojornalismo.E o curso de Jornalismo é voltado pra comunicação e não pra imagem.

E como você chegou no Diário de Pernambuco?

Comecei fazendo umas fotos para o suplemento cultural do Diário Oficial. Depois fiquei por algum tempo como freelancer pro Jornal do Commércio. Em seguida, me chamaram pra trabalhar na Secretaria de Imprensa do Palácio do Governo.Fiquei lá durante 7 anos, até que surgiu o convite para trabalhar no Diário. Fiquei trabalhando no Diário e no Palácio durante um ano ainda, mas tive que decidir entre um e outro.Não estava dando pra conciliar os plantões de final de semana e viagens também.




Foto de Teresa Maia


Qual o tipo de foto que você mais gosta de fazer?
Gosto de adrenalina, por isso prefiro as pautas mais agitadas a fazer fotos de objetos e produtos... Prefiro mesmo a “pauleira" da rua, é assim que me sinto viva.


Apesar dessa profissão já ter vingado entre as mulheres, existe ainda algum tipo de preconceito?
Existe, existe sim... Hoje em dia a gente quase não percebe isso, é muito sutil.Mas por exemplo, fazer futebol é coisa pra macho, saca? Dificilmente você vai encontrar fotógrafas nos estádios.A não ser que algum colega não esteja podendo ir, coisas desse tipo.E fotografar futebol é como andar de bicicleta, mesmo depois que você aprende a equilibrar e pedalar sozinho, de vez em quando você tem que ir pra rua, senão é arriscado você se esborrachar no chão.A gente tem que ter agilidade, treinar o olho pra isso. Não é só chegar e apertar o dedo. Quando entrei no jornal, eram 16 fotógrafos que me olhavam de banda. É claro que não posso generalizar, mas era assim mesmo. Hoje a gente brinca lembrando desse tempo.

E hoje?
Hoje somos dez e a equipe é dividida entre fotógrafos e fotógrafas.Mas eles sabem que a gente se garante na rua.

E este preconceito que você diz que ainda existe, ele chega a ser um obstáculo para seu desempenho?
Não. Para quem é persistente, não.

E quais são então, as maiores dificuldades de sua profissão?
A maior dificuldade é a falta de estrutura mesmo,o leitor nunca vai saber disso, óbvio. Mas de certa forma ele deve perceber a nossa deficiência em determinadas coberturas. Não é sempre que isso ocorre, mas não estar bem equipado faz diferença no resultado final.Falta as vezes até equipamento pra gente trabalhar. Chegamos a trabalhar com apenas uma câmera.Como o meu horário sempre foi o primeiro, nunca me faltou equipamento, mas meus colegas tinham que esperar que eu voltasse da rua pra poder sair.Além dessa falta de estrutura, tem a questão do espaço. Você sabe que o que sustenta o jornal é o anúncio.E por conta dele, muitas vezes nosso material não é bem aproveitado.Isso gera uma certa frustração. É complicado.

Qual a postura que o fotógrafo tem que ter em todas as situações? Seja uma pauta quente, seja uma pauta fria?
A postura é estar sempre muito atento. Porque as vezes uma pauta que aparentemente não vai lhe render uma boa imagem, pode virar e surgir uma puta foto.. É muito relativo. É estar ligado e tirar sempre o melhor proveito do que você está fazendo: melhor ângulo etc...

O que é mais atraente na profissão de fotógrafo?
O que mais me agrada é sair de casa sem saber o que vou fazer. Apesar de ter meu horário, de ter que fazer a reprodução de um bandido hoje, amanhã e depois, é diferente. Não existe uma rotina, Isso é que é legal. Posso estar no palácio cobrindo a visita da Rainha da Inglaterra e daqui a pouco estar dentro de uma favela, num protesto.

Dentre os prêmios que você mais ganhou, qual foi o mais especial?
As pessoas costumam brincar muito comigo dizendo que saio de casa com um “kit” para trabalhar,levando um sobrinho meu, sacolas, chupeta e mamadeira... Gosto de fotografar crianças. Já ganhei alguns prêmios ligados a infância. O Ayrton Senna, por exemplo.É um prêmio importante e com uma quantia significativa em dinheiro. Mas o prêmio que mais me emocionou foi o Vladimir Herzog, na área de Direitos Humanos . Ambos ganhei com a mesma foto. Além destes, recebi uma menção honrosa no prêmio Rei da Espanha da imprensa internacional.


Foto de Teresa Maia

Além de fotógrafa, você se enxerga em outra profissão?
Fico pensando: se não fosse fotógrafa, o que é que eu poderia ser? Mas não consigo me enxergar fazendo outra coisa... Ainda não... O que penso é o que fazer quando sair do jornal. Outro caminho terei que dar para a minha profissão. Sempre voltada para a fotografia, claro. Mas não sei ainda... Acho que ainda tenho tempo para pensar.


Qual a situação do fotojornalismo atualmente e qual o futuro do fotojornalismo?
Em Pernambuco acho que cresceu. Com a chegada da digital deu uma acelerada no processo. Agora, o que nos deixa meio intrigado é o outro lado. É que com a chegada da digital, todo mundo virou fotógrafo. E isso deu uma quebrada. A maioria das assessorias, por exemplo, se viram sozinhas. Repórteres de texto andam com uma maquininha a tira colo. Mas de um modo geral, demos uma crescida. Não dá mais pra você pensar em fazer jornal sem uma máquina digital. Mas sinto saudades do tempo das analógicas, acho que a gente perde muito com essa coisa de dar um “click “ e olhar. É inevitável. A gente termina olhando mesmo. E esse hábito não é bom..E com a analógica era como uma gravidez, onde a mãe espera nove meses até poder ver o rostinho do seu filho. Do mesmo jeito era o processo de revelação onde a gente tinha que esperar um tempo para ver a cara do trabalho.

Agora, esta realidade se reflete no Brasil e no mundo?
No mundo... Isso é uma coisa bem mais ampla, mas com certeza a coisa evoluiu.

Qual a situação mais perigosa que você viveu?
Fiz uma matéria sobre crianças trabalhando em lixões na Muribeca, Mirueira e Aguazinha. O trabalho era à noite. Nós não víamos um palmo sequer em nossa frente e era um lugar “punk”. Chegamos lá, eu e a repórter. O motorista não quis nos acompanhar porque estava morrendo de medo, ficou com o carro ligado. Acho que pra correr se fosse preciso. Os caras tinham a maior cara de bandido, posso estar sendo até preconceituosa, mas essa era a cara deles mesmo e dava medo.Eles nos olhavam de cima pra baixo. Eu estava com câmera, cheia de lentes, tal. Eles começaram a me encarar e aí pensei, ou falo logo com os caras e mostro que não estou com medo, ou então estou ferrada. Aí no impulso peguei no braço de um deles e pedi ajuda pra caminhar no meio daquela montanha de lixo. Foi a única forma que encontrei de quebrar aquela distância. E deu certo.

E qual foi a situação mais frustrante que você teve? Aquela que você esperava fazer ótimas fotos e acabou não dando muito certo.
Situação frustrante? São tantas... Não tem nenhuma especial, pois isso é muito comum acontecer. Difícil é quando rende.

Agora uma cômica:
Ah, geralmente são os erros nossos. Um colega cair, escorregar... Eu mesma já caí na frente do governador uma vez.
Israel Leal

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